sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

O fantasma da Imigração

Em qualquer lugar, de qualquer cidade, nos deparamos com mentes que, não ostentando cabeças rapadas, argumentam da forma mais vil e sem consistência, argumentos fascistas, xenófobos e racistas, quando é óbvio o crescimento de Portugal desde meados dos anos 1990, baseado na mão-de-obra imigrante. A partir do momento que se pensou em construir, em catadupa, como se de cogumelos se tratassem, prédios e obras públicas e privadas, a mão-de-obra imigrante foi a salvaguarda para o enriquecimento dos grandes senhores deste país, em particular, e da Europa, em geral. Basta que se pesquise devidamente estes factos, seja no INE, em observatórios de investigação, artigos na net, etc, que esta realidade se torna tão clara como 1+1=2. Segundo dados do ACIDI, a mão de obra imigrante, em tempo de crise e de despedimentos colectivos, é a primeira a ser dispensada; outra realidade é também o facto de, os imigrantes em Portugal, representarem metade daqueles que, sendo portugueses se encontram no estrangeiro a trabalhar, e que têm as mesmas aspirações que os que chegam ao nosso país.
Creio que a comunicação social devia ter um papel mais imparcial e justo na informação que é passada às populações. A verdade é que raramente pomos em causa aquilo que o jornalista informa, principalmente quando falamos em meios televisivos. Nem sempre a notícia é tal e qual como está a ser dita. Só para exemplificar, quando há uns anos se noticiou o “arrastão”, ouviu-se falar em 500 indivíduos negros, numa praia de Carcavelos, a espalhar o terror. Quando, um ou dois dias depois, entidades de segurança pública vieram abordar o assunto, informando que não se tratava de 500 mas de 15 ninguém deu importância - quando falo no assunto com outras pessoas, não encontro ninguém que se recorde desta segunda notícia. As generalizações de que qualquer ser humano se serve para categorizar o seu quotidiano, são grandemente influenciadas por situações semelhantes a esta. É mais fácil justificar um acto violento e criminoso com base no “estes tipos não valem nada e deviam ir para a terra deles”, do que pensar em desmistificar estas coisas e pensar que todas as manhas, centenas de mulheres e homens imigrantes acordam para servir o país por um ordenado tão miserável que muitos portugueses são incapazes de aceitar. Há pessoas boas e más em qualquer lado – existem indivíduos de palitó, sentados nas suas secretarias a administrar o país e as suas empresas, que nos roubam directamente do bolso e nós vemos impávidos e serenos. Esses são tão ladrões, criminosos e vigaristas como qualquer jovem delinquente que cresceu num bairro social com baratas a passearem na cozinha, casas essas facultadas pelo Estado mas onde os senhores governadores não gostariam de viver (como qualquer outro cidadão que saiba o que é viver em situações condignas)? Creio que não, são bem piores - a diferença é que têm um sistema que os protege e permite que sejam corruptos, debaixo das nossas barbas.

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Ensaios

Sorvi mais um golo daquele licor amargo que me arde no estômago. Era como se milhares de espinhos me ferissem as entranhas. À minha volta uma imensidão de gente envolta num fumo e numa luz amena se perdia em conversas de bar enquanto davam os seus goles nas bebidas corrosivas. Eu perdia-me na minha. Sinto-me anestesiado e gosto. Sinto que pairo no ar, sentado naquele banco, e toco as estrelas. Entro numa galáxia e o escuro que me envolve adormece-me. Sou acordado pelo empregado do bar, com um berro. Já me conhece e sabe que tenho esse hábito, o de me perder. “Não quero ter de te levar a casa outra vez. Não te sirvo mais nenhum copo!”, disse, mas não liguei, ainda tinha o meu licor a meio. Vi que as paredes giravam e me embalavam de volta à galáxia, perto das estrelas. Senti-me pequeno. Dei mais um trago daquele licor que corrói e senti-me aquecido nos braços dela. Toquei no seu cabelo loiro e nos seus caracóis soltos e no peito da minha mãe encontrei-me reconfortado. Cantava ao meu ouvido a música de berço que já não me lembrava. Disse-me “Está tudo bem” e acreditei. Acho que estive nos seus braços longas horas, adormecidas. Senti o seu calor e a mão áspera do trabalho que acarinhava o meu tormento e o sossegava. Acordei contrariado, pela voz que me expulsava, mas ainda sentia aquele cheiro, aquele toque aquele sussurro.
O frio da rua gelou-me os ossos. Cambaleei até à esquina e apoiei-me no poste que iluminava a rua. Conseguiria chegar até casa? Faltavam alguns quarteirões…
Um pouco mais à frente vi um homem encolhido pelo frio, nas escadas de um prédio. Cambaleando, procurei uma moeda no meu bolso e estendi-lha e prossegui o meu caminho. Deparei-me com um percurso longo mas sabia que ele não demorava mais de 10m a ser percorrido. Parei a meio e ergui o pescoço para o céu que me cobria. Queria voltar e pairar mas o gelo que sentia não me deixava perder. Apoiei-me na parede e tacteei as ruas até casa. Empurrei a porta sem fechadura e subi as escadas de joelhos até à porta que me introduzia naquilo a que eu chamava casa. Sem forças e zonzo, tirei os sapatos e deitei-me na cama fria e vazia. O escuro do quarto acomodou-me à minha solidão costumeira e gemi por isso. Estava só, mais uma vez. Peguei no frasco que deixava todas as noites debaixo da almofada e bebi tudo. Sabia que ia voltar a pairar nas estrelas. E lá estava ela, dizendo-me ao ouvido “O amor sussurra”.


Por Clara Coelho

Em memória de Al Berto

Deixo aqui um link para aceder ao integral de um poema, "TRÊS CARTAS DA MEMÓRIA DAS ÍNDIAS". Na altura, há alguns anos, era a segunda vez que lia Al Berto, e confirmei, mais uma vez, que este era uma poeta incomparável, tão esquecido nos nossos dias. Temos aqui uma mente brilhante, uma escrita viciante. Al Berto deixou-nos em 1997.

"O Corvo" de Edgar Allan Poe - Tradução de Fernando Pessoa

O CORVO

Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste, Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais, E já quase adormecia, ouvi o que parecia O som de alguém que batia levemente a meus umbrais «Uma visita», eu me disse, «está batendo a meus umbrais. É só isso e nada mais.» Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro, E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais. Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada P'ra esquecer (em vão) a amada, hoje entre hostes celestiais — Essa cujo nome sabem as hostes celestiais, Mas sem nome aqui jamais!
Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais! Mas, a mim mesmo infundindo força, eu ia repetindo, «É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais; Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais. É só isso e nada mais».
E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante, «Senhor», eu disse, «ou senhora, decerto me desculpais; Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo, Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais, Que mal ouvi...» E abri largos, franquendo-os, meus umbrais. Noite, noite e nada mais.
A treva enorme fitando, fiquei perdido receando, Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais. Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita, E a única palavra dita foi um nome cheio de ais — Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais. Isto só e nada mais.
Para dentro estão volvendo, toda a alma em mim ardendo, Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais. «Por certo», disse eu, «aquela bulha é na minha janela. Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais.» Meu coração se distraía pesquisando estes sinais. «É o vento, e nada mais.»
Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça, Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais. Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento, Mas com ar solene e lento pousou sobre meus umbrais, Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais. Foi, pousou, e nada mais.
E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura Com o solene decoro de seus ares rituais. «Tens o aspecto tosquiado», disse eu, «mas de nobre e ousado, Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais! Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais.» Disse-me o corvo, «Nunca mais».
Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro, Inda que pouco sentido tivessem palavras tais. Mas deve ser concedido que ninguém terá havido Que uma ave tenha tido pousada nos seus umbrais, Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais, Com o nome «Nunca mais».
Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto, Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais. Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento Perdido, murmurei lento, «Amigo, sonhos — mortais Todos — todos lá se foram. Amanhã também te vais». Disse o corvo, «Nunca mais».
A alma súbito movida por frase tão bem cabida, «Por certo», disse eu, «são estas vozes usuais. Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais, E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais Era este «Nunca mais».
Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura, Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais; E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira Que qu'ria esta ave agoureira dos maus tempos ancestrais, Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais, Com aquele «Nunca mais».
Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo À ave que na minha alma cravava os olhos fatais, Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando No veludo onde a luz punha vagas sombras desiguais, Naquele veludo onde ela, entre as sombras desiguais, Reclinar-se-á nunca mais!
Fez-me então o ar mais denso, como cheio dum incenso Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais. «Maldito!», a mim disse, «deu-te Deus, por anjos concedeu-te O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais, O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!» Disse o corvo, «Nunca mais».
«Profeta», disse eu, «profeta — ou demónio ou ave preta! Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais, Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais, Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!» Disse o corvo, «Nunca mais».
«Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!, eu disse. «Parte! Torna à noite e à tempestade! Torna às trevas infernais! Não deixes pena que ateste a mentira que disseste! Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!» Disse o corvo, «Nunca mais».
E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais. Seu olhar tem a medonha dor de um demónio que sonha, E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão mais e mais, E a minh'alma dessa sombra, que no chão há mais e mais, Libertar-se-á... nunca mais!

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

O Betinhos Andam Aí...


A Juventude "Social Democrata"(?) decidiu lançar uma campanha contra o Governo do Partido "Socialista" e de José Sócrates. É difícil discernir onde começa a hipocrisia e o cinismo... Uma juventude partidária de um partido que, como o PS, não tem feito outra coisa senão aldrabar e sonegar as esperanças aos portugueses, vem agora com uma campanha nojenta a atacar o que eles próprios fazem. Haja decoro... Haja honestidade...

Capitalistices...


Não posso negar que fico com um ligeiro esgar de satisfação no rosto quando oiço capitalistas acérrimos virem-se com frases como esta... O falhanço total do capitalismo está à vista. Mas penso, e como toda gente faz profecias hoje em dia, sobretudo os economistas mais encostados à direita, que diziam que isto ia ser um mar de rosas, há uns anos, dizia eu, então, que penso, sinceramente, que o pior ainda está para vir. Com a confluência de todos estes factores como a precariedade (ninguém me tira da cabeça que estes despedimentos de efectivos só servem para contratar, daqui a meses ou um ano, trabalhadores com vínculos precários), o desemprego massivo, o descontentamento popular a radicalizar-se, as alterações climáticas que vão ter implicação no nosso dia não daqui a muito tempo, a concentração de fortunas nas mãos de poucos, e outros factores mais, daqui a alguns tempos a situação tornar-se-á insustentável. Para já, já vamos levando com Basílios Hortas a dizerem que não sabem o que hão-de fazer. Quando toca a extorquir aos trabalhadores, isso está na ponta língua. Meus caros, o tempo resolve tudo. Para melhor ou para pior. Mas o seu curso é inexorável, tornando as coisas futuras inevitáveis. Repito, melhores ou piores. Mas isso compete-nos a nós...

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Quer PS ou PSD?

Acho que o Pedro Passos Coelho quer ser Primeiro-Ministro... Ouvi dizer por aí... Ah!!, foi ontem na entrevista ao Mário Crespo! Bom, mas que dizer? O tipo, engravatado, claro, cunho de todos aqueles que são honestos, lá veio dizer que está disponível para sê-lo. E há malta que vai atrás disto... Para quê, pergunto eu? Para mudar as moscas e a merda pemanecer a mesma? Eu bem me lembro que bem falava o Sócrates tempos antes de ir para ao cargo de Primeiro-Ministro... Que bem que ele soava... Mas os interesses destes senhores é claro, e nada vai mudar se PS ou PSD forem Governo. É pena as pessoas não se mentalizarem disto... Mas democracia é democracia, e há que respeitar...

Lá Vai a Fatinha, Com a Saia Côr do Mar!

Apesar de estar em julgamento há demasiado tempo, diga-se, a nossa querida Fatinha continua a gamar os cofres da Câmara de Felgueiras para gáudio de todos aqueles que adoram a macacada e continuam a votar em macaquinhos para exercer o poder em Portugal. O Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República veio hoje a terreiro dizer que, cito, "o eleito local apenas poderá exigir o pagamento das despesas [com processos judiciais] após a decisão final" e que "os pagamentos feitos noutras circunstâncias são ilegais, pelo que deve ser exigida a devolução das respectivas quantias". Entretanto o Público acrescenta que "um inquérito está já a correr no Ministério Público." Aguardamos com lágrimas nos olhos (de tanto rir, entenda-se) o que este inquérito e este julgamento vão dar.
P.S. - Uma última palavra para os felgueirenses; foram vocês que pediram uma Fatinha? Aturem-na!

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Esquecimentos...

As notícias da manhã têm, por vezes, um peso tão grande que nos podem deixar ou com uma felicidade enorme estampada no rosto, ou com com um aspecto sorumbático e rezingão para o resto do dia. Há, ainda, as indiferentes. Ou que nos deixam indiferentes. Mas acordar com esta notícia, é obra... O que se sabe, e se está fartíssimo de saber, é que Sócrates é o simpático adepto de uma via de "socialismo" que não é a terceira, mas, se possível, uma quarta, quinta ou sexta. Uma via que deixa o grande capital de sorriso de orelha a orelha, que deixa os bancos ganharem o que não devem, que rouba ao Estado, ou seja a nós, que aumenta as taxas moderadoras da saúde indexadas a um valor meramente economicista, mas que deixa os bancos engordarem com "esquecimentos" pelos corredores do Ministério... As prioridades deste Governo são óbvias. E tornam-se cada vez mais, a cada dia que passa. Um bem haja aos banqueiros, que nos lixam mensalmente, e ao Governo, que o faz diariamente.
PS - Ainda à guisa desta história do aumento das taxas moderadoras: qualquer Governo verdadeiramente socialista já teria abolido algo que é perfeitamente injusto e injustificável. Com o dinheiro que é mal gasto o que serve para engordar os já anafados, haveria suficiente para o Estado garantir uma saúde gratuita e universal. Ainda para mais indexando o valor de aumento das taxas moderadores através de um indicador economicista e tendencioso. Perfeitamente aberrante. A vergonha segue dentro de momentos.